segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Fabrício Carpinejar


Você tem medo? Medo, de alguma coisa assim normal, banal?
Eu tenho medo
Medo de me apaixonar
Medo de sofrer o que não estou acostumada
Medo de me conhecer e esquecer outra vez
Medo de sacrificar amizade
Medo de perder a vontade de trabalhar, de aguardar uma coisa que mude de repente, de alterar o trajeto para apressar encontros
Medo se o telefone toca
Medo se o telefone não toca
Medo da curiosidade, de ouvir o nome dele em alguma conversa
Medo de inventar uma desculpa para ser livre do medo
Medo de me sentir observada ao excesso, de descobrir que a nudez ainda é pouca perto de um olhar insistente, não suportar ser olhada com esmero e devoção
Eu tenho medo de ser engolida como se eu fosse líquido, de ser beijada como se eu fosse líquen e ser tragada como se eu fosse leve
Medo de me apaixonar por mim mesma
Medo de enfrentar a infância, o seio que criou para aquecer as minhas mãos quando criança
Medo de ser a última a vir para mesa, a última a voltar da rua ou a última a chorar
Eu tenho medo de me apaixonar e não prever o que pode sumir, o que pode desaparecer
Eu tenho medo de me roubar para dar a ele, de ser roubada e pedir de volta
Medo de que ele seja um canalha
Medo de que até mesmo seja um poeta
Medo de que seja amoroso
Medo de que talvez ele seja um pilantra, incerto do que realmente quer, talvez todo em um único homem, todos um pouco por dia
Eu tenho medo do imprevisivel que foi planejado
Eu tenho medo de que ele morda os lábios e prove a minha carne
Medo de oferecer o lado mais fraco do corpo, o corpo mais lado da fraqueza
Medo que ele seja o homem certo na hora errada
Medo de dar a hora certa para homem errado
Eu tenho medo de me ultrapassar e me esperar por anos, até que eu antes disso e eu depois disso possamos nos coincidir novamente
Medo de largar o tédio, afinal eu e o tédio enfim nos entediamos
Medo que ele inspire a violência da posse, a violência do egoísmo, que não queira repartir ele com mais ninguém, nem com o seu passado
Medo que ele não queira se repartir com mais ninguém além dele
Medo que ele seja melhor que minhas respostas, pior que minhas dúvidas
Medo que ele não seja vulgar para escorraçar, mas deliciosamente rude para chamar, que ele se vire para não dormir, que ele se acorde ao escutar o tom da minha voz
Medo de ser sugada como se fosse pólen, soprada como se fosse brasa e recolida como se fosse paz
Medo de ser destruída, aniquilada, devastada e não reclamar da beleza das ruínas
Medo de ser antecipada e ficar sem ter o que dizer
Medo de não ser interessante o suficiente para prender a sua atenção
Medo da independência dele, da sua algazarra, da facilidade que ele tem de fazer amigas
Medo de que ele não precise de mim
Medo de ser uma brincadeira dele quando fala sério ou banque o sério quando faz uma brincadeira
Medo do cheiro dos travesseiros
Medo do cheiro das roupas
Medo do cheiro nos cabelos
Medo de não respirar sem recuar
Medo de que o medo entrar no medo seja maior de que o medo de sair do medo
Medo de não ser convincente na cama, persuasiva no silêncio, carente no fôlego
Medo de que a alegria seja apreenssão, de que o contentamento seja ansiedade
Medo de não soltar as pernas das pernas dele
Medo de soltar as pernas das pernas dele
Medo de convida-lo a entrar, mas de deixa-lo ir
Medo da vergonha que vem junto da sinceridade
Medo da perfeição que não interessa
Medo de machucar, ferir, agredir para não ser machucada, ferida, agredida
Medo de estragar a felicidade por não merece-la
Medo de não mastigar a felicidade por respeito
Medo de passar pela felicidade sem reconhece-la
Medo do cansaço de parecer inteligente, quando não há o que opinar
Medo de interromper o que recém iniciou, de começar o que terminou
Medo de faltar as aulas e mentir como foram
Medo do aniversário sem ele por perto, dos bares, das baladas sem ele por perto, do convívio sem alguém para se mostrar
Medo de enlouquecer sozinha, e olha, não há nada mais triste do que enlouquecer sozinha
E quando eu menos percebi, eu estava apaixonada e com medo disso.

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